17-06-2006
Irão: a crise nuclear e a bolsa petrolífera
Alberto Cruz
Rebelión/Igadi
O mundo continua entretido com a questão nuclear iraniana, mais agora que o Alto Representante da UE para a Política Exterior, Javier Solana,, entregou às autoridades iranianas a proposta dos cinco membros permanentes do Concelho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, para incentivar o Irão a abandonar o seu programa de enriquecimento de urânio. Na qual que se inclui previsivelmente (1), uma oferta para que esta fase seja feita numa escala reduzida, numa central experimental e debaixo do controlo internacional dentro do território iraniano.
No passado dia 5 de junho, quase simultaneamente à visita de Solana a Teerão, o país persa anunciava - algo que passou despercebido - a abertura de uma zona de livre comércio [NE: zona franca?] na ilha de Kish, o passo crucial para a bolsa petrolífera que vem funcionando de forma experimental desde à algum tempo e que se anunciou oficialmente no passado dia 20 de março, coincidindo com o início do ano persa, comece a operar. Duas companhias europeias, a Total-Fina-Elf (França) e a Agip (Itália) já têm ali os seus escritórios regionais (2) porque consideram que a bolsa de Kish se vai converter no quinto mercado de petróleo, após os de Nova Iorque, Londres, Singapura e Tóquio. A iniciativa surge quase em paralelo com o anuncio da Noruega de que está a estudar a possibilidade de criar a sua própria bolsa petrolífera em euros. A ser assim, tiraria mercado a Londres, cujo peso está a decrescer porque a produção britânica de petróleo não para de cair desde o ano 2005.
O capital inicial com que se abre a bolsa iraniana (Iranian Oil Bourse) é de 2000 milhões de dólares - sim dólares, embora a pretensão iraniana seja de que a bolsa comece a utilizar o euro como moeda de troca, mas não a médio prazo - e ainda se está na fase de captação de clientes. De momento, o Irão não vai mudar o padrão referencial do petróleo para o euro, à espera de ver como se resolve o contencioso, artificial, sobre a questão nuclear. Quando der esse passo, num momento em que também a Rússia anunciou a conversão do rublo em moeda de transações internacionais para 1 de julho - especialmente para o comércio do petróleo e gás - (3), a estabilidade do dólar como moeda de referência na economia mundial está como os seus dias contados. As exportações de petróleo da Rússia somam 15,2% do total mundial, enquanto as do Irão se situam nos 5,8%. Se a elas se somam as da Venezuela (5,4%), que na recente conferência da OPEP celebrada em Caracas expressou o seu desejo de substituir o dólar pelo euro, um quarto do mercado do petróleo e gás se transacionaría em euros.
Por agora a bolsa iraniana é a mais avançada, a Rússia se prepara para arrancar em inícios de 2007 e a postura da Venezuela não é mais do que uma foram de pressão sobre os EUA ante as suas constantes ameaças que vertem desde a administração Bush contra o governo de Hugo Chávez. Mas aí estão como possibilidade de destabilização económica dos EUA. E o Irão joga nisso, consciente que está numa posição de força. O ministro do petróleo, Mohammad Javad Assemipour, disse que "por agora", o comércio do petróleo se fará em dólares mas que a intenção do Irão é que o comércio do Irão com os países da região e da Ásia se faça em euros. A menção à Ásia é importante porque se a China e a Índia entram na bolsa iraniana - e este país tem participado, na categoria de observador na Organização de Cooperação de Xangai (4), que se celebrou a semana passada nessa cidade - se terá dado o golpe de misericórdia no dólar. Actualmente 68% do comércio internacional do petróleo se realiza em dólares, pelo que se chegasse a baixar o volume de liquidez do dólar mesmo que só 10%, os EUA entrariam numa fase de depressão económica que tenderia a superar a do princípio do século XX.
Talvez aí se explique o ênfase que põem os EUA e uma parte da Europa nas sanções económicas ao Irão se não puser fim ao seu programa de enriquecimento do urânio. De certo, está incluído nessa ameaça de sanções a proibição dos bancos ocidentais de aceitar qualquer tipo de transação com os bancos iranianos, com a qual se dificultaria o êxito da bolsa petrolífera.
Prestígio e influência
A defesa do direito do Irão a desenvolver o seu programa nuclear, a parte que cumpre os requisitos do Tratado de Não Proliferação, encerra também uma busca de prestígio e influência regional. O Irão procura ser considerado o factor imprescindível nessa zona do mundo, um papel que até o ano de 1990 - com a primeira guerra do golfo - jogava o Iraque. E fá-lo baseado em duas importantes premissas: por um lado, pela influência que está exercendo no Iraque, o qual conseguiu converter num verdadeiro quebra-cabeças para as tropas ocupantes lideradas pelos EUA. Hoje pode se dizer sem medo de se equivocar que o Irão foi o principal beneficiário da invasão do Iraque. Se antes da invasão de março de 2003, o Iraque era um contrapeso sunita ao desejado expansionismo chiíta na região, hoje a influência iraniana no Iraque e outros países, é maior do que nunca. Por outro lado, também pelo impressionante crescimento económico que alcança os 6,2% anuais. As exportações de petróleo e gás (estas últimas ainda incipientes) passaram de 23.000 milhões de dólares para 55.000 milhões em somente 2 anos como consequência do aumento dos preços do barril de petróleo e as reservas monetárias em moeda estrangeira situam-se nos 47.000 milhões de dólares, o dobro da dívida externa, apesar das estimativas dizerem que terminará o ano de 2006 com reservas de 62.000 milhões de dólares.
Como sempre, os números não são do agrado de todos. O Banco de Mundial estima que "apesar do crescimento dos últimos anos, os rendimentos per capita continuam uns 30% abaixo do que era em meados dos anos 70 [quando se produziu a revolução islâmica] (5). O que não diz o BM é que desde então o Irão tem estado submetido a um sério embargo e sanções impostas pelos EUA de forma unilateral, desde à já 27 anos, o tempo que leva a revolução islâmica no poder, e que durante 8 anos, de 1980 a 1988, o Irão susteve uma caríssima guerra, em vidas e para a economia, desencadeada pelo Iraque com o beneplácito do ocidente e o resto dos regimes árabes para conter o efeito expansivo da revolução islâmica na região.
O que é inquestionável é que nos últimos anos o crescimento económico iraniano tem sido sólido, embora ainda haja muitas falhas por resolver, como o índice de desemprego (oficialmente em 10,3%, embora seja possível situar-se realmente no dobro), a saída do país de jovens para trabalhar em países vizinhos e... a dependência na importação de gasolina. Parece curioso como um dos principais produtores de petróleo do mundo tenha que importar cerca de 40% do total de gasolina que consome, especialmente dos países vizinhos árabes mas também da Venezuela. Como não é de descartar que em caso de ameaça de sanções se incluía o embargo à exportação de produtos refinados de petróleo para o Irão, as autoridades deste país decidiram antecipar-se e já anunciaram o estabelecimento de planos para racionar a gasolina a partir de setembro deste ano.
Incentivar os conflitos
Os iranianos que compram gasolina a um ridículo preço (7 cêntimos de euro por litro), não veriam com bons olhos uma situação de escassez, na qual se criaria o caldo de cultivo propício para esse tão ambicionado pelo ocidente "despertar" da sociedade iraniana, que suponha o derrube do governo islâmico.
Enquanto essa situação não chega os países ocidentais estimulam os conflitos étnicos como o de Baluchistão (6), Azerbaijão e Khuzistão. Nesta última, com uma população de maioria árabe, aonde assenta a maior percentagem das reservas de petróleo do Irão, vêem se produzindo atentados e é evidente a intervenção de serviços secretos ocidentais, especialmente britânicos. O episódio da detenção de dois soldados britânicos - posteriormente libertados pela força pelas tropas do seu país - por parte da polícia iraquiana quando íam cometer atentados na cidade de Bassorá é uma pequena amostra do que é a intervenção dos serviços secretos ocidentais no vizinho Irão.
No Azerbaijão é a própria arrogância iraniana para com a língua azeri que tem estimulado uma série de manifestações de protesto que, recentemente, se estenderam a pelo menos cinco cidades, Tabriz, Urumieh, Ardebil, Maragheh e Zanjan. Não obstante, o Irão acusa a Turquia de estar por de trás dos protestos, numa tentativa de recuperar o seu papel naquela zona, muito debilitado depois da invasão anglo-americana do Iraque. Para 70% da população turca, os EUA são maior ameaça que qualquer outro país, incluindo o Irão. No seu mau momento, o primeiro ministro turco optou por ajudar o seu tradicional padrinho, EUA, agitando o seu complicado vizinho, Irão.
O conflito de Baluchistão é essencialmente religioso, considerando que a maioria da população é sunita. Aqui actua uma organização denominada "Soldados de Alá" que vem realizando acções armadas à algum tempo. No passado dia 14 de maio, produziu-se um ataque contra vários veículos que causou 12 mortos. Na reivindicação do atentado, os "Soldados de Alá" disseram que era pessoal militar enquanto os iranianos disse que eram civis.
Todas estas questões devem ser tidas em conta quando se fala do conflito nuclear iraniano. Tanto que os "iranólogos" consideram que o Irão pretende responder na mesma moeda, fomentando rebeliões das comunidades chíitas por todo o Médio Oriente. Junto ao caso do Hezbolla no Líbano que, do qual já falamos anteriormente (7), mencionam-se dois países, Arábia Saudita, onde há uma importante comunidade chíita na região mais rica em petróleo e no Bahrein.
Esta última possibilidade, Bahrein, cria muito desassossego nos EUA tendo em conta que neste país está estacionada a chefia da quinta frota da marinha de guerra, a que tem o encargo da "defesa" do estreito de Ormuz, por onde circula 40% de todo o petróleo a nível mundial. Em caso de ameaça de guerra, o Irão, como já fez na guerra como Iraque, podia encerrar este estratégico local. Mas há uma diferença em relação ao sucedido à 20 anos atrás: então o Irão tinha um exército débil e o encerramento só foi eficaz por uns dias, enquanto que agora o exército iraniano está bem equipado e treinado. As manobras e exibições que realizou nos meses de março e abril são uma clara advertência da sua capacidade militar.
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(1) Alberto Cruz, “India e Irão: outra amostra de hipocrisia ocidental”, Rebelión, 6 de março de 2006.
(2) “O Banco Asiático de Desenvolvimento prevê uma tempestade monetária”, Red Voltaire, 19 de abril de 2006.
(3) David Kimble, “Collapse of the Petrodollar Looming”, Globalresearch, 21 de maio de 2005.
(4) A Organização de Cooperação de Xangai foi criada em 1996 com o objectivo de reforçar a cooperação em matéria de fronteiras e controlar o tráfico ilícito de estupefacientes, armas e explosivos. De ela fazem parte o Cazaquistão, a China, o Quirguistão, a Rússia, o Tadjiquistão e o Uzbequistão. Estes seis países ocupam 61% do território eurasiático e contam com a quarta parte da população mundial. Nos últimos anos tem jogado um importante papel também no aspeto económico, aonde a China tem muito que ganhar. A presença do Irão nesta conferência implicará um importante freio aos conflitos étnicos e religiosos que se vivem em várias zonas do Irão, como Baluchistão, Azerbaijão e Khuzistão. É necessário salientar também que a China, o segundo importador mundial de petróleo, compra 13 por cento do crude que processa ao Irão e quer aumentar as suas aquisições de gás natural. Nos primeiros 4 meses deste ano, as suas importações de crude iraniano aumentarão 25 por cento a respeito do mesmo período do ano passado.
(5) Washington Institute, 6 de junho de 2006.
(6) Jane’s Intelligence Review, 17 de maio de 2006.
(7) Alberto Cruz, “Os EUA procuram no Líbano recompor a sua estratégia para o Médio Oriente”, 10 de abril de 2006, e “A ONU, outra vez, ao serviço dos EUA e Israel”, 23 de maio de 2006. Ambos os artigos publicados no Rebelión.
albercruz@eresmas.com
Fonte: Rebélion
http://www.rebelion.org/noticia.php?id=33207
Irão: a crise nuclear e a bolsa petrolífera
Alberto Cruz
Rebelión/Igadi
O mundo continua entretido com a questão nuclear iraniana, mais agora que o Alto Representante da UE para a Política Exterior, Javier Solana,, entregou às autoridades iranianas a proposta dos cinco membros permanentes do Concelho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, para incentivar o Irão a abandonar o seu programa de enriquecimento de urânio. Na qual que se inclui previsivelmente (1), uma oferta para que esta fase seja feita numa escala reduzida, numa central experimental e debaixo do controlo internacional dentro do território iraniano.
No passado dia 5 de junho, quase simultaneamente à visita de Solana a Teerão, o país persa anunciava - algo que passou despercebido - a abertura de uma zona de livre comércio [NE: zona franca?] na ilha de Kish, o passo crucial para a bolsa petrolífera que vem funcionando de forma experimental desde à algum tempo e que se anunciou oficialmente no passado dia 20 de março, coincidindo com o início do ano persa, comece a operar. Duas companhias europeias, a Total-Fina-Elf (França) e a Agip (Itália) já têm ali os seus escritórios regionais (2) porque consideram que a bolsa de Kish se vai converter no quinto mercado de petróleo, após os de Nova Iorque, Londres, Singapura e Tóquio. A iniciativa surge quase em paralelo com o anuncio da Noruega de que está a estudar a possibilidade de criar a sua própria bolsa petrolífera em euros. A ser assim, tiraria mercado a Londres, cujo peso está a decrescer porque a produção britânica de petróleo não para de cair desde o ano 2005.
O capital inicial com que se abre a bolsa iraniana (Iranian Oil Bourse) é de 2000 milhões de dólares - sim dólares, embora a pretensão iraniana seja de que a bolsa comece a utilizar o euro como moeda de troca, mas não a médio prazo - e ainda se está na fase de captação de clientes. De momento, o Irão não vai mudar o padrão referencial do petróleo para o euro, à espera de ver como se resolve o contencioso, artificial, sobre a questão nuclear. Quando der esse passo, num momento em que também a Rússia anunciou a conversão do rublo em moeda de transações internacionais para 1 de julho - especialmente para o comércio do petróleo e gás - (3), a estabilidade do dólar como moeda de referência na economia mundial está como os seus dias contados. As exportações de petróleo da Rússia somam 15,2% do total mundial, enquanto as do Irão se situam nos 5,8%. Se a elas se somam as da Venezuela (5,4%), que na recente conferência da OPEP celebrada em Caracas expressou o seu desejo de substituir o dólar pelo euro, um quarto do mercado do petróleo e gás se transacionaría em euros.
Por agora a bolsa iraniana é a mais avançada, a Rússia se prepara para arrancar em inícios de 2007 e a postura da Venezuela não é mais do que uma foram de pressão sobre os EUA ante as suas constantes ameaças que vertem desde a administração Bush contra o governo de Hugo Chávez. Mas aí estão como possibilidade de destabilização económica dos EUA. E o Irão joga nisso, consciente que está numa posição de força. O ministro do petróleo, Mohammad Javad Assemipour, disse que "por agora", o comércio do petróleo se fará em dólares mas que a intenção do Irão é que o comércio do Irão com os países da região e da Ásia se faça em euros. A menção à Ásia é importante porque se a China e a Índia entram na bolsa iraniana - e este país tem participado, na categoria de observador na Organização de Cooperação de Xangai (4), que se celebrou a semana passada nessa cidade - se terá dado o golpe de misericórdia no dólar. Actualmente 68% do comércio internacional do petróleo se realiza em dólares, pelo que se chegasse a baixar o volume de liquidez do dólar mesmo que só 10%, os EUA entrariam numa fase de depressão económica que tenderia a superar a do princípio do século XX.
Talvez aí se explique o ênfase que põem os EUA e uma parte da Europa nas sanções económicas ao Irão se não puser fim ao seu programa de enriquecimento do urânio. De certo, está incluído nessa ameaça de sanções a proibição dos bancos ocidentais de aceitar qualquer tipo de transação com os bancos iranianos, com a qual se dificultaria o êxito da bolsa petrolífera.
Prestígio e influência
A defesa do direito do Irão a desenvolver o seu programa nuclear, a parte que cumpre os requisitos do Tratado de Não Proliferação, encerra também uma busca de prestígio e influência regional. O Irão procura ser considerado o factor imprescindível nessa zona do mundo, um papel que até o ano de 1990 - com a primeira guerra do golfo - jogava o Iraque. E fá-lo baseado em duas importantes premissas: por um lado, pela influência que está exercendo no Iraque, o qual conseguiu converter num verdadeiro quebra-cabeças para as tropas ocupantes lideradas pelos EUA. Hoje pode se dizer sem medo de se equivocar que o Irão foi o principal beneficiário da invasão do Iraque. Se antes da invasão de março de 2003, o Iraque era um contrapeso sunita ao desejado expansionismo chiíta na região, hoje a influência iraniana no Iraque e outros países, é maior do que nunca. Por outro lado, também pelo impressionante crescimento económico que alcança os 6,2% anuais. As exportações de petróleo e gás (estas últimas ainda incipientes) passaram de 23.000 milhões de dólares para 55.000 milhões em somente 2 anos como consequência do aumento dos preços do barril de petróleo e as reservas monetárias em moeda estrangeira situam-se nos 47.000 milhões de dólares, o dobro da dívida externa, apesar das estimativas dizerem que terminará o ano de 2006 com reservas de 62.000 milhões de dólares.
Como sempre, os números não são do agrado de todos. O Banco de Mundial estima que "apesar do crescimento dos últimos anos, os rendimentos per capita continuam uns 30% abaixo do que era em meados dos anos 70 [quando se produziu a revolução islâmica] (5). O que não diz o BM é que desde então o Irão tem estado submetido a um sério embargo e sanções impostas pelos EUA de forma unilateral, desde à já 27 anos, o tempo que leva a revolução islâmica no poder, e que durante 8 anos, de 1980 a 1988, o Irão susteve uma caríssima guerra, em vidas e para a economia, desencadeada pelo Iraque com o beneplácito do ocidente e o resto dos regimes árabes para conter o efeito expansivo da revolução islâmica na região.
O que é inquestionável é que nos últimos anos o crescimento económico iraniano tem sido sólido, embora ainda haja muitas falhas por resolver, como o índice de desemprego (oficialmente em 10,3%, embora seja possível situar-se realmente no dobro), a saída do país de jovens para trabalhar em países vizinhos e... a dependência na importação de gasolina. Parece curioso como um dos principais produtores de petróleo do mundo tenha que importar cerca de 40% do total de gasolina que consome, especialmente dos países vizinhos árabes mas também da Venezuela. Como não é de descartar que em caso de ameaça de sanções se incluía o embargo à exportação de produtos refinados de petróleo para o Irão, as autoridades deste país decidiram antecipar-se e já anunciaram o estabelecimento de planos para racionar a gasolina a partir de setembro deste ano.
Incentivar os conflitos
Os iranianos que compram gasolina a um ridículo preço (7 cêntimos de euro por litro), não veriam com bons olhos uma situação de escassez, na qual se criaria o caldo de cultivo propício para esse tão ambicionado pelo ocidente "despertar" da sociedade iraniana, que suponha o derrube do governo islâmico.
Enquanto essa situação não chega os países ocidentais estimulam os conflitos étnicos como o de Baluchistão (6), Azerbaijão e Khuzistão. Nesta última, com uma população de maioria árabe, aonde assenta a maior percentagem das reservas de petróleo do Irão, vêem se produzindo atentados e é evidente a intervenção de serviços secretos ocidentais, especialmente britânicos. O episódio da detenção de dois soldados britânicos - posteriormente libertados pela força pelas tropas do seu país - por parte da polícia iraquiana quando íam cometer atentados na cidade de Bassorá é uma pequena amostra do que é a intervenção dos serviços secretos ocidentais no vizinho Irão.
No Azerbaijão é a própria arrogância iraniana para com a língua azeri que tem estimulado uma série de manifestações de protesto que, recentemente, se estenderam a pelo menos cinco cidades, Tabriz, Urumieh, Ardebil, Maragheh e Zanjan. Não obstante, o Irão acusa a Turquia de estar por de trás dos protestos, numa tentativa de recuperar o seu papel naquela zona, muito debilitado depois da invasão anglo-americana do Iraque. Para 70% da população turca, os EUA são maior ameaça que qualquer outro país, incluindo o Irão. No seu mau momento, o primeiro ministro turco optou por ajudar o seu tradicional padrinho, EUA, agitando o seu complicado vizinho, Irão.
O conflito de Baluchistão é essencialmente religioso, considerando que a maioria da população é sunita. Aqui actua uma organização denominada "Soldados de Alá" que vem realizando acções armadas à algum tempo. No passado dia 14 de maio, produziu-se um ataque contra vários veículos que causou 12 mortos. Na reivindicação do atentado, os "Soldados de Alá" disseram que era pessoal militar enquanto os iranianos disse que eram civis.
Todas estas questões devem ser tidas em conta quando se fala do conflito nuclear iraniano. Tanto que os "iranólogos" consideram que o Irão pretende responder na mesma moeda, fomentando rebeliões das comunidades chíitas por todo o Médio Oriente. Junto ao caso do Hezbolla no Líbano que, do qual já falamos anteriormente (7), mencionam-se dois países, Arábia Saudita, onde há uma importante comunidade chíita na região mais rica em petróleo e no Bahrein.
Esta última possibilidade, Bahrein, cria muito desassossego nos EUA tendo em conta que neste país está estacionada a chefia da quinta frota da marinha de guerra, a que tem o encargo da "defesa" do estreito de Ormuz, por onde circula 40% de todo o petróleo a nível mundial. Em caso de ameaça de guerra, o Irão, como já fez na guerra como Iraque, podia encerrar este estratégico local. Mas há uma diferença em relação ao sucedido à 20 anos atrás: então o Irão tinha um exército débil e o encerramento só foi eficaz por uns dias, enquanto que agora o exército iraniano está bem equipado e treinado. As manobras e exibições que realizou nos meses de março e abril são uma clara advertência da sua capacidade militar.
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(1) Alberto Cruz, “India e Irão: outra amostra de hipocrisia ocidental”, Rebelión, 6 de março de 2006.
(2) “O Banco Asiático de Desenvolvimento prevê uma tempestade monetária”, Red Voltaire, 19 de abril de 2006.
(3) David Kimble, “Collapse of the Petrodollar Looming”, Globalresearch, 21 de maio de 2005.
(4) A Organização de Cooperação de Xangai foi criada em 1996 com o objectivo de reforçar a cooperação em matéria de fronteiras e controlar o tráfico ilícito de estupefacientes, armas e explosivos. De ela fazem parte o Cazaquistão, a China, o Quirguistão, a Rússia, o Tadjiquistão e o Uzbequistão. Estes seis países ocupam 61% do território eurasiático e contam com a quarta parte da população mundial. Nos últimos anos tem jogado um importante papel também no aspeto económico, aonde a China tem muito que ganhar. A presença do Irão nesta conferência implicará um importante freio aos conflitos étnicos e religiosos que se vivem em várias zonas do Irão, como Baluchistão, Azerbaijão e Khuzistão. É necessário salientar também que a China, o segundo importador mundial de petróleo, compra 13 por cento do crude que processa ao Irão e quer aumentar as suas aquisições de gás natural. Nos primeiros 4 meses deste ano, as suas importações de crude iraniano aumentarão 25 por cento a respeito do mesmo período do ano passado.
(5) Washington Institute, 6 de junho de 2006.
(6) Jane’s Intelligence Review, 17 de maio de 2006.
(7) Alberto Cruz, “Os EUA procuram no Líbano recompor a sua estratégia para o Médio Oriente”, 10 de abril de 2006, e “A ONU, outra vez, ao serviço dos EUA e Israel”, 23 de maio de 2006. Ambos os artigos publicados no Rebelión.
albercruz@eresmas.com
Fonte: Rebélion
http://www.rebelion.org/noticia.php?id=33207
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